29/09/2020

A última apresentação

Quem diria que nessa altura da vida eu estadia num palco. Mas, qual o assombro?
Ao longo da vida desempenhei tantos papeis que não é nenhuma novidade. Me formei ator numa famosa escola chamada Sofrimento.
Dos diversos papeis, o mais marcante talvez tenha sido numa peça chamada infância, na qual as outras personagens diminuíam, provocavam, maltratavam e espancam a minha personagem. Foi tão marcante, que eu jurei nunca mais interpretar algo semelhante. Até hoje lembro das falas e dos sentimentos evocados. 
Agora estou neste palco, diante de vocês para interpretar um novo papel: o da decadência humana. 
Seja na minha pele flácida, que esconde minhas dores e tristezas entre as rugas, seja na minha barba branca, que brilha toda minha amargura (mas o que importa é o brilho resplandecente), seja na minha falta de força nas pernas, que já não sustentam todo o sofrimento que carrego nos ombros. 
Conte comigo. Eu sou perfeito pra este papel tão autobiográfico. 

02/09/2020

Segurança em pó

Veio puxar conversa com essa frase: a segurança é perigosa. 
Olhei nos olhos secos e brancos, interessado pelo assunto que me tomou no susto. 

"A segurança é perigosa, meu amigo. Te faz ter certeza do que nunca foi certo e nunca será. O cuidado se descuida, e o calor se torna insuportável. 
A segurança é perigosa, meu amigo. Os ouvidos se fecham, e a voz desinteressa. Não adianta gritar para ouvidos que decidiram ser boca. O grito é inaudível. Você ouve?
A segurança é perigosa, meu amigo. O interesse em ser vira o interesse em ter, e o controle rompe a compaixão. Qual a distância entre existir e partir?
A segurança é perigosa, meu amigo. Se você não tem medo, você não enxerga, não se atenta. E quando ficar cego, será tarde. O que foi não volta mais."

E antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, já era tarde demais. 

A simulação real do universo imaginário e presente

  Era um poeta dos sonhos e um pintor das reflexões mais profundas. Sua mente transbordava de ideias surreais, mergulhadas em um mar de dúvi...