27/08/2022

Brevidade que intoxica.

 Por eleição na qual somente ele votou, optou por alterar seu estado de consciência. Não achou uma boa ideia seguir com agulhas, preferiu inalar as incertezas em carreiras, fumar certezas precipitadas, tomar comprimidos de alegrias momentâneas e sem motivos, e beber da aguardente do esquecimento. 

As drogas eram a razão para continuar vivo. Drogas tão legais que o mantinham com a capacidade de se lembrar de respirar. Como um peixes num aquário, limitado pelo vídeo invisível, interrompendo sua ida, vinda de onde nunca foi, seu fluxo, seu destino ceifado com a foice do escuridão. 

Mais um trago de consciência equivale a diminuição da capacidade inútil de confiar numa divindade que sabe seu destino, e que o pune por não o seguir, mesmo que seja a pessoa mais benevolente não segui-lo significa ofensa grave a vosso senhor. 

Prefiro meu corpo nu, meus pelos cruzados e meu suor sagrado. Meu corpo é só meu, e o que sinto é problema meu. Nem que calce meus sapatos você saberá a zona que se instala dentro da minha mente. 

A minha mente sempre mente. Confie é o fim da sua vida será breve. 

Tão breve quanto fumaça branca dissipando no ar. 

Breve. 

Muito breve. 

20/08/2022

(Ab)sinto

 Numa overdose criativa, encheu mais uma taça de ideias organizaras em camadas de importância, mas que eram engolidas num só grande gole. Sem piedade, devorou três tabletes de puro fluxo contínuo de pensamentos doces e enjoativos. 

Para o enjoo, caneta e papel. Para a overdose, soro da verdade e sinceridade. Para o leitor, palavras desconexas da realidade para de encerrarem na beleza de serem palavras carregadas de sentido. Sem sentido, reduze-se a palavra a ela mesma, esvaziada de significado, de importância, de existência. 

Morreu um poeta, morreu mais um, morreu outro poeta, é só mais um. Quem dá a importância que a fada verde tem, suave na garganta, aquecendo o estômago, embaralhando pensamentos e distorcendo a realidade. 

Absinto no fim, não se se sinto ou se acredito no infinito da imaginação como se deve imaginar. Se meu caminho é a morte em devaneio, ao sufocamento no próprio vômito de vontades reprimidas e espremidas. 

O que ele queria era pintar um quadro de realidade, distorcida pela utopia da evolução, da revolução da preguiça por detrás do vidro da enfermaria. Dos vidros dos carros, dos vidros das telas das tv’s, das telas dos computadores e celulares. 

Afogou-se no fermentado das ideias rejeitadas, azedas de desprezo e corroídas de emoções. Acredite no poeta quando o absinto é tudo o que sinto. 

Soluço da vida

 Pelo canto da boca escorriam as palavras não ditas, as frases não terminadas, e os textos apagados. Tudo o que engoliu durante anos, de fato haviam parado na garganta, num amontoado emaranhado de significados puros distorcidos pela ação do silêncio, conflitos inevitáveis das intenções presas na flor-de-lis na lâmina dos dentes, concordâncias sufocadas no enrolado da língua e, sem ter menos ou mais importância, o afogado de vocabulário esquecido na saliva grossa e ácida. 

 Havia decidido: vou pensar antes de falar. De tanto pensar, deixou de observar, de aprender e de lidar com frustração. E por ter parado de dizer, o que os outros diziam eram como o ar que entra nos meus pulmões, mas que ali permanecem, comprimidos, espremidos, misturados com tudo o que nao havia dito. 

 O tempo é um inimigo, é bem melhor é o inimigo conhecido. O tempo desconhecido cala a quem o segue. Deixando de dizer, deixou de existir, pois se existe, o faz por propósitos comunicados, e quando não o faz, soluça, como vírgulas em locais não reconhecidos, e, também, por assim dizer, seu excesso pode provocar reações inesperadas. Calou-se e preferiu não existir. 

19/08/2022

O cheiro da morte

Aquele fenômeno estranho estava acontecendo diante dos céus olhos: não amanheceu. Eram 09:30 da manhã e nada de amanhecer. 

Não conseguia enxergar um palmo na frente do nariz. Sabia que estava na rua, mas os postes estavam desligados, a lua e as estrelas também haviam desaparecido. 

Olhava para qualquer lado que fosse, mas não enxergava mais nada, não sabia onde estava, é tudo o que ouvia ao seu redor era o choro triste de sua filha. 

Foi neste dia que sentiu o cheiro das flores, o cítrico dos sabores, e o belo das cores. Porém, se era cedo demais ou tarde demais, nunca saberei o que aconteceu comigo. Foi neste dia que morri. 

14/08/2022

A droga que se é: fume-a.

Naquele domingo à noite se deu conta que estava entorpecida pela realidade. Estava mais do que exausta de tanto se esforçar em respirar. Não aguentava mais ter que inspirar e expirar, ela queria mesmo era fazer fumaça. Muita fumaça. 

Decidiu então fazer o que deveria ser feito para a fumaça subir. Com a ajuda de um espelho para ajudar a ter mais precisão e um cutelo para ir mais rápido, ela tratou de se fatiar e depois cortar em pequenos cubinhos de si mesma. Não satisfeita, ralou-se. 

Juntou partículas de si mesma e bolou no mais belo beque que se já ouviu falar. Se achava tão grande e valiosa, acima de tudo, maior que Deus, universo e multiverso juntos, sem nem mesmo ter se dobrado ao diabo, se acha tão superior que por si só se fumaria em tragos demorados. 

Por segundos estaria esfumaçada e aprisionada no pulmão de quem a fumasse e em seguida a liberasse por aí, carregando junto de si as memórias de quem a fumou. 

Os canibais modernos fumam tanto de si, que nenhuma droga é mais poderosa do que a droga que se é. 


A simulação real do universo imaginário e presente

  Era um poeta dos sonhos e um pintor das reflexões mais profundas. Sua mente transbordava de ideias surreais, mergulhadas em um mar de dúvi...