25/04/2012

Elegância da decadência

Então chegou como quem não queria nada, bebeu do meu copo, babou na minha cerveja e me encarou. Cambaleava de um lado para o outro, num balé digno de aplausos de quem bebia e jogava nas mesas de plástico. Bebeu do copo de outros e de outras. Falava de seus ódios e seus amores, suas frustrações, dissabores e mentiras. Falava em estupro, em prazer, em música alta, em corpos atados. Babava...
Virou mais um copo, que não era seu. Apoiou-se no meu ombro, depois em outros ombros. De ombro em ombro foi fazendo reverência, mesmo que não fosse essa sua intenção. Não havendo mais ombros, caiu.
O bar fechou. E no final do show elegantemente decadente, um cão ao seu lado recostou.

11/04/2012

Sem

Sem vontade, sem cor, sem gosto. Sem capacidade de mover os dedos. Sem noção, sem amor, sem você.

08/04/2012

Trinta

Os cabelos levaram parte da beleza pelo ralo. As marcas no rosto denunciaram a fuga da juventude. A essa altura, a infância já tinha desaparecido sorrateiramente. Os olhos não brilhavam mais com tanta força, nem enxergavam a vida lá fora com tamanha nitidez. A única certeza é que o cérebro, somente o cérebro, tinha se fortalecido, e se não fosse pelo incrível cérebro, não haveria razão prá seguir, pois a sensibilidade não teria a quem recorrer...
Enfim, 30-trinta.

06/04/2012

Coração de vento

A pulsação havia sumido, ou pelo menos pensou que havia sumido. Tentou sentir no lado do pescoço com o dedo indicar e o dedo médio levemente apoiados sobre o local preciso onde deveria haver pulsação, e nada sentiu. Tentou sentir no pulso, com os mesmos dois dedos, mas nada sentiu. Tomou cuidado, inclusive, de não tentar sentir com o dedão, pois poderia confundir a sensação de batimentos cardíacos.
Sabia que não deveria ter atendido aquela ligação. Sabia. Sentia-se quente, via-se vermelho frente ao espelho, conseguia sentir o sangue percorrendo todo o interior do seu corpo. Mas não achava a pulsação.
O telefone tocou novamente. Sentiu na boca o que não sentia em nenhuma parte do corpo. Sentiu na boca a ritmada batida de um "eu te amo" encurralado entre os dentes, esmagado entre os lábios, e inaudível para seu interlocutor.

A simulação real do universo imaginário e presente

  Era um poeta dos sonhos e um pintor das reflexões mais profundas. Sua mente transbordava de ideias surreais, mergulhadas em um mar de dúvi...