20/08/2022

Soluço da vida

 Pelo canto da boca escorriam as palavras não ditas, as frases não terminadas, e os textos apagados. Tudo o que engoliu durante anos, de fato haviam parado na garganta, num amontoado emaranhado de significados puros distorcidos pela ação do silêncio, conflitos inevitáveis das intenções presas na flor-de-lis na lâmina dos dentes, concordâncias sufocadas no enrolado da língua e, sem ter menos ou mais importância, o afogado de vocabulário esquecido na saliva grossa e ácida. 

 Havia decidido: vou pensar antes de falar. De tanto pensar, deixou de observar, de aprender e de lidar com frustração. E por ter parado de dizer, o que os outros diziam eram como o ar que entra nos meus pulmões, mas que ali permanecem, comprimidos, espremidos, misturados com tudo o que nao havia dito. 

 O tempo é um inimigo, é bem melhor é o inimigo conhecido. O tempo desconhecido cala a quem o segue. Deixando de dizer, deixou de existir, pois se existe, o faz por propósitos comunicados, e quando não o faz, soluça, como vírgulas em locais não reconhecidos, e, também, por assim dizer, seu excesso pode provocar reações inesperadas. Calou-se e preferiu não existir. 

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